sexta-feira, 7 de junho de 2013

A dor causada pelo câncer de mama

(Foto: David Jay)



Semana passada me deparei com uma série de fotografias de David Jay, um fotografo de moda que registra a beleza de modelos. O curioso é que as fotos não eram direcionados ao mercado da moda, na verdade as fotos que vi foi de me emocionar, o fotografo registrou a luta de mulheres portadoras do câncer de mama contra a doença. 

Vi todas aquelas mulheres realmente bonitas, mostrando as mamas marcadas pela mastectomia resultada do tratamento da doença. Entre todas as fotos fui tomada pela emoção ao ver uma mulher ruiva chorando diante da câmera, apenas ela chorou, e apesar de não sabermos o que ela sentia (pois só sabe a dor de passar por tal situação quem nela está), em meus olhos veio lágrimas.  

Imagino que naquele momento, ali diante da câmera posando com sua mama a mostra, na cabeça dessa moça ruiva passava todos os momentos desde que descobrira o câncer, o tratamento, o medo, as preocupações, a mutilação. 

Bombardeadas todos os dias pela ditadura da beleza que estampa as capas de revistas, novelas, programas de reality shows, com corpos perfeitos, padrões que “devemos seguir” para sermos consideradas lindas e desejadas. Hoje que os seios perfeitos aparecem como símbolo de sensualidade, como essas mulheres se sentem ao perder a sua mama?

A mulher ao ser diagnosticada, além de lidar com o tratamento, as questões econômicas para sustentá-lo, e as consequências deste que leva, em muitos dos casos, a mastectomia, ela enfrenta uma crise de identidade feminina, pois existe também a questão cultural em que a mama aparece como símbolo da feminilidade, sensualidade e maternidade. 
 
No imaginário social, a mama está associada a atos de prazer, a amamentação, a sedução e a caricia. A amamentação é o contato estabelecido pela mãe com o seu filho, naquele ato ela alimenta a criança e também o acolhe. Então, ao passar pelo processo de mastectomia, a mulher passa pelos piores sentimentos que pode sentir: a rejeição, inferioridade e baixa autoestima. O contato com seu filho no ato da amamentação é cortado, diante da ditadura da beleza em que vivemos perde a autoestima, e o medo de ser rejeitada pelo seu parceiro a atormenta. 

Pode-se considerar então que “a falta da mama e a falta do seio representam, num primeiro momento, a morte simbólica da mulher”.



Referência: SILVA, Lucia Cecília da (2008). Câncer de Mama e sofrimento psicológico: Aspectos relacionados ao feminino.


Fotos de David Jay: http://www.pragmatismopolitico.com.br/2013/05/ensaio-de-mulheres-com-cancer-de-mama.html

quinta-feira, 8 de março de 2012

Máscaras

Os olhos dela estavam úmidos e perdidos desde a noite anterior, quando voltara da rua.  Fred não entendia o que estava acontecendo, o silêncio de Inês o preocupava. Perguntou durante o jantar, entre garfadas e copos d’água o que se passava, mas Inês não respondeu. Depois, antes de descansarem a cabeça no travesseiro, Fred repetiu a pergunta e Inês apenas tocou os seus lábios no rosto dele e deitou-se.

Na manhã seguinte, ela ainda possuía aquele olhar triste, sentada no sofá com as pernas dobradas em pose de meditação, seus ombros caídos acompanhavam a tristeza de seu rosto. Estava mergulhada em pensamentos secretos, esse objeto de desejo de Fred que a observava de pé na porta. Notou as unhas curtas da outra, seu movimento quando lentamente sua cabeça baixou e em poucos minutos levantou.

 Fred aproximou-se, sentou na outra ponta do sofá assistindo a distância de Inês, que parecia ter entrado em outro mundo e estava cada vez mais se perdendo. Não conseguia suportar aquele comportamento dela sem fazer nada, pois antes de pegar no sono, na noite anterior e ao acordar, pensou diversas vezes em uma resposta para tudo aquilo e nada lhe veio.

Aproximou-se mais um pouco da outra, sua mão pousou em uma das pernas dela que logo respondeu com aquele olhar úmido. Ele disse tocando seu rosto: - O que tem? Não pode ficar assim em silêncio, me torturando, nem sei se sou responsável por isso.

Inês respirou, desviou seus olhos dele, balançou a cabeça negando a dúvida de Fred.

- Então, diz Inês, porque estou ficando preocupado demais com você. Fred tocou as mãos dela, queria que sentisse segurança e falasse sobre sua tristeza. A abraçou e sentiu o seu corpo quente e seus cabelos estavam perfumados, depois voltou a olhar para ela que respirou e disse:

- Estou magoada, estou decepcionada, me sinto enganada, sabe? Eu poderia quebrar tudo, eu poderia xingar todos, eu poderia gritar, mas não consegui.

- Como assim? Lhe fizeram mal? Brigou com alguém?

- Briguei com o mundo Fred, eu não entendo porque que todos têm sempre que ser cruéis, fofoqueiros, maldosos, egoístas? Me diz? Por que todo mundo está sempre procurando um espaço para derrubar o outro?

- O mundo é assim Inês, você devia parar de acreditar que todo mundo é uma boa pessoa, elas não são, até nós mesmos podemos não ser. Mas me diz o que aconteceu que você voltou para casa com essa revolta?

- Nada diretamente comigo, eu devia ser menos observadora, nesse momento eu queria ser um pouco cega para não ver alguns tentando destruir outros.

- Entenda uma coisa Inês, todo mundo fala de todo mundo, ninguém é perfeito e as pessoas sempre procuram perfeição e todos querem ser perfeitos, mas isso não existe, só em nossa imaginação. Quando a gente se apaixona, por exemplo, a gente não conhece o outro, a gente conhece o que a gente constrói do outro e mais tarde quando os verdadeiros defeitos dele aparecem e temos de lhe dá com eles, ai sim descobrimos se o amamos mesmo. Estou tentando dizer a você que não viva tanto mergulhada em outro mundo, não acredite tanto nesse mundo, você tem de saber a verdade sobre o mundo em que vivemos e precisa se acostumar com ele. E daí se os outros estão se comendo vivos, participando de um teatro todos os dias, rindo um com os outros em uma sala e dando tapinha nas costas e depois ao atravessarem a porta despejam veneno uns nos outros? E daí? Você tem que colocar sua máscara e participar do teatro ou você não sobreviverá. Entende?

Inês ouvia as palavras de Fred sem tirar os olhos dos castanhos dele, ela acreditava no que ele dizia, estava mais calma quanto a sua revolta, mas não aceitava a crueldade do mundo. Segurou as mãos dele e lhe beijou a testa, Fred sentiu que estava lhe devolvendo a paz e desejava ver Inês com um sorriso no rosto novamente.

- Tudo bem, vou tentar.








Incompreendida

Amava muitas coisas e odiava muitas outras, pensava que se listasse tudo não caberia na página em branco em sua mente. Achava lindo viver, mas compreendia que era muito difícil. Todos os dias era momento de se transformar, tirar a casca velha que lhe cobria e renascer, excluir defeitos, desconstruir-se e reconstruir-se. Estava aprendendo a viver.

A fase de tentar compreender as coisas havia passado e agora se perdia na tentativa diária de saber viver. Só então entendia a angústia de ser um personagem de Clarice Lispector.

Viver não é fácil meu bem, mas vai e tenta. Desafiava a si mesma todos os dias.

Sentia que os outros não a compreendia e aqueles que demonstravam a compreender, certamente a interpretavam errado e isso lhe doía os pensamentos. Não pensar, às vezes, era bem mais fácil (mas era difícil se privar de pensar, pensar em não pensar já está pensando), o bombardeamento de pensamentos lhe colocava em situações complicadas, em conflito consigo mesma e era a pior das situações.

Carregava um mundo dentro de si onde tudo era mais intenso, sonhos, desejos, dores, tristezas. Se perdia dentro dela e voltava cheia de dúvidas e ansiedade. Sorridente, meio perdida, pobre de concentração.

Pensava como certos sentimentos eram tão particulares, quando do início de uma paixão, por exemplo, sente-se indescritível, algo como uma alegria que cresce aos poucos. E ainda que outros conheçam aquele sentir, cada sentir, em cada corpo e coração é inexplicavelmente particular.

E tudo isso, do que diz respeito a sentimento não está para entender e sim para sentir e era o que fazia. Quando se pegasse tentando se perder ao querer explicar para si mesma uma palavra de ternura trocada, um toque na mão e um sorriso nos lábios, não pensaria, mas sentiria com corpo e alma.

Não queria nada do passado, desejava o mundo do presente, mas entendia que não podia abraçar tudo de uma só vez. Do futuro não sabia e preferia não pensar, mas era inevitável.

Acreditava mais no bem que no mal, o que a tornava ingênua. Para ela a política separava as pessoas, ela tão pacífica, tão quieta, detestava que a colorissem, ela que só tinha um lado, o dela mesma. Ela que acreditava e defendia os direitos da mulher se irritava com a ausência de união entre elas, com a inveja e outros sentimentos ruins que muitas alimentavam umas pelas outras.

E ser mulher era outra aprendizagem. O que era para ela ser mulher?

Era jovem ainda, mas pensava nas palavras de seus pais sobre o futuro. “Quando você for mãe irá entender”. Essa frase se confirmará mais tarde, ela sabia e se preparava para ter seus pensamentos amadurecidos no futuro, mas por enquanto ainda era cedo.

Boba, sentimental, seus olhos se emocionaram diante de algumas crianças em festa em apresentação folclórica, e parava encantada enquanto para os outros era algo comum. Bonito, mas comum.

Em dias de espírito doente sentia o mundo feio e contra ele ficava, sentia uma dor que vinha de dentro e que lhe deixava sem muitas palavras e lhe roubava a calma. Sentia vontade de fugir e esconder-se até acalmar tudo e entendia que era dentro de si que precisava resolver as coisas, lá fora tudo estava como sempre, as pessoas usando suas máscaras e lutando uns contra os outros, alguns até vivendo felizes, outros apenas fingindo.

E para sobreviver a dias como esses era preciso colocar a armadura, pois que fazia parte do mundo e precisava participar dele, querendo ou não, havia obrigações a cumprir. Quando o dia acabasse, estaria segura em casa e tudo seria colorido novamente.






sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Eles





- Sou teu homem agora e a amo. Ele disse a ela, sentindo como se trocasse de lugar. Lembrava que sempre ouvira outras mulheres dizer assim a um homem: Eu sou tua. Ou um homem dizer: Minha mulher. E de imediato ela confirmar: Sim sou tua mulher. Mas, nesse caso, disse a ela sendo abraçado pelos braços femininos, que era dela.

- Sim, é meu e te amarei sempre. E eu sou tua, estou me dando pra você. Beijava os cabelos do homem abraçado ao seu corpo.

- E não tem medo?

- Sim. Tenho medo de voltar a ser a de antes, tenho medo de não poder viver tudo isso. Eu quero sentir. Mas isso depende de nós, principalmente de mim. Não quero dizer que estou no comando ou que você faz o que quero, não é isso que quero dizer. Entre nós desejo igualdade, respeito e amor. Digo isso, pois sou vilã de mim mesma e tenho medo de me atrapalhar e não me permitir, mas como nova mulher isso não vai acontecer. Irei me proteger e lhe peço paciência, estou em momento de transformação todos os dias, em aprendizagem. Eu estou aprendendo a ser mulher. Seus olhos diziam para ele.

E assim esperava que ele tomasse conta dela, pois ela cuidaria dele, porém precisava mais de cuidados que ele. Desejava que ele a protegesse do mal invisível que era a tristeza e também dela mesma, quando viesse a ser sua vilã. Ela segurou sua mão e ali estava o seu porto e um marinheiro que não partiria.

Regaria todos os dias aquele sentir para que criasse raízes e desenvolvesse, crescesse dentro deles se estendendo para fora.

Tudo aquilo era muito mais particular para ela do que ele imaginava. Havia passado por um longo caminho até chegar ali, e ainda que quisesse que ele conhecesse aquela história, preferia não contar. Ele talvez não entendesse. Talvez mais tarde em um momento maior ele compreendesse e encontrasse beleza em tudo o que guardava.

Ela sorriu para ele e tudo era real.




terça-feira, 1 de novembro de 2011

Sorriso largo no rosto



Uma manhã que nasce de sol lindo no céu azul, apesar de escaldante calor. E lá vou eu pisando no chão molhado da chuva da noite passada. Fone de ouvido e a trilha sonora que eu escolhi pra mim, para o episódio do meu dia.



Sentindo nada, nem dor, nem sono, nem falta, nada, apenas respiração que vem de dentro subindo, subindo e me traz um sorriso, sei lá porque, mas é bom e é assim, simples, sem motivo.



Otimismo demais? Sei lá. Talvez alguns ainda me julguem falsa-feliz tentando disfarçar tristeza. Mas, decidi ser feliz todos os próximos dias da minha vida, pra quê estressar tão cedo se ainda temos as próximas horas do dia para tapar os buracos com calma, resolver as pendências, visitar a família, pegar ônibus cheio, etc.? Por que reclamar tanto se sou tão jovem e com tão boa saúde? Não há por que. Por que não segurar a onda e respirar quando o mundo ameaçar cair e tentar resolver tudo numa boa? Pois é, foi isso que escolhi pra mim.



Sorriso largo no rosto, na alma, no fígado, no rim, como eu puder sorrir irei sorrir, pelo menos tentar, porque tentar não paga, mas ajuda muito. (risos) E se o céu é azul e lindo eu serei também, linda e feliz, porque passado e dor tá fora de moda baby e eu quero evitar rugas e não quero morrer estressada do coração, não mesmo. Hahahaha.


sábado, 16 de julho de 2011

Curta-metragem: Sorriso largo no Rosto ;)


Uma garota sente uma alegria imensa dentro si. Paz de espírito? Livre de si mesma? Livre dos seus medos?

terça-feira, 14 de junho de 2011

Uma paixão, uma arma e la putana

Parte IV


Não tinha notícias de Henrique, desde a noite em que o expulsou de sua porta. E não fazia questão de saber, estava cheia das confusões dele, e ter sacado uma arma em sua frente havia sido a gota d’água.

Estava concluindo o ensino médio, era um ano decisivo para a garota. Naquela tarde assistia a uma aula de geografia e viajava em coisas nada haver com o mapa-múndi, pensava em como diria a sua mãe que pretendia ir embora da cidade no fim do ano, e já imaginava a despedida de seus amigos.

O sinal tocou chamando os alunos para um intervalo, cortando a empolgação da professora de geografia. Os alunos deixaram os livros e saíram rapidamente da sala de aula, Maria não fez diferente, foi ter na lanchonete com Lúcia. E foi lá que recebeu a ligação desesperada de dona Lourdes, mãe de Henrique. Chorava ao telefone descrevendo a destruição que o filho fez em casa, e a sua partida sem destino.

-          Pode deixar dona Lourdes, que eu sei bem onde esse vagabundo deve estar... Não chora, pois o Henrique não merece metade das lágrimas da senhora. Até mais dona Lourdes, fica bem.

***
Manhã de sábado, o sol iluminava a pequena cidade alagoana que estava movimentada por conta da feira livre. Homens gritando, anunciando os seus produtos, a carne que sangrava na mesa imunda, frutas frescas, donas de casas enfeitadas com bobis na cabeça e puxando os carrinhos de metal onde guardavam as compras para o almoço.

No meio da feria estava Maria. Carregava consigo uma expressão nada amigável, olhos alertas. Procurava uma casa, conferia de quando em quando um endereço no papelzinho em sua mão. Finalmente, a poucos metros encontrou, e foi ter na casa verde. Diminuiu os passos e parou diante da casa, conferindo ainda uma vez o endereço, era ali, não havia dúvidas. O portão estava aberto, abriu cuidadosamente, mas um pequeno ruído foi inevitável, não se deu o trabalho de fechar e aproveitou que a porta também estava entreaberta e adentrou na casa.

Henrique, sentado no sofá assistia TV, as pernas descansavam esticadas em um banco. Em uma das mãos uma cerveja e no rosto uma expressão assustadora de surpresa ao ver Maria diante dele. Saiu de sua postura largada, enquanto Maria desligava a TV e do corredor surgia a La putana com quem ele estava morando.

-          O que está fazendo aqui minha amiga?
-          Vai, pega tuas coisas e vamos embora Henrique...
-          Quem é você vagaba? La putana, mexia a cabeça e o corpo enquanto indagava com as mãos na cintura. Possuía uma valentia impressionante, mas não maior que a ousadia de Maria.
-          Diz para essa aí não falar comigo.
-          Mas, você está na casa dela...
-          Olha aqui Henrique, eu não tenho tempo pra conversinhas...
-          Você pensa que manda em mim ô garota...
-          Mas, eu mando mesmo. Pega logo suas coisas e vamos embora. Tua mãe me telefonou Henrique, como é que você apronta uma coisa dessas pra ela, derrubou tudo em casa e depois vem morar nesse muquifo?
-          Mas, você é muito ousada...

La putana armou-se de violência e voou em cima de Maria, que rápida colocou os braços para proteger seu rosto. Henrique agarrou a La putana arrastando ela para um canto da sala, Maria aproximou-se deles com olhos grandes.

-          Chega, eu não vim aqui para trocar tapas com uma mulher como você por causa de um tipo como Henrique. E você Henrique, pegue suas coisas e vamos embora, estou esperando lá fora.
Maria ajeitou a camisa amassada pela confusão, os dedos penetraram nos fios dos cabelos, colocando-os para trás. Deixou a casa.

Henrique soltou a La putana, pensava com as mãos na cabeça dando voltas pela sala. Ela ainda tinha raiva, suas mãos tremiam e sua boca não parava de soltar palavras sujas. Henrique entrou pelo corredor em direção ao quarto e voltou com o tênis na mão e a mochila nas costas, deixando a outra sem acreditar no que via. Resmungou: - Você é um pau-mandado mesmo, não acredito que vai com essa mimada saf...

-          Hey, chega. Nada de palavrões com ela. Eu vou embora.

Foi ter com Maria na porta da casa, ela olhava para o relógio no pulso quando viu os pés dele descalços ao lado dos seus. 

-          Antes que confunda as coisas, saiba que vim aqui por causa da sua mãe, e tão cedo não quero ver você no meu caminho e tão cedo não quero ouvir falar se você andou aprontando.

Caminharam juntos e o silêncio os acompanhou.